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sábado, 29 de outubro de 2011

Destino final

A tarde estava quente. Mal teve tempo de engolir o arroz com linguiça que costumeiramente pedia no armazém da nove de abril. Neste dia, um dia atípico mesmo numa cidade do interior,  e pior para aqueles que possuíssem míseros valores em poupança, o governo confiscara todos os direitos de saques bancários, o ano de 1990 entraria para a história da política brasileira; o dia em que a população saberia do que seria capaz um governo corrupto e mordaz. Feita sua refeição, retornou ao carro e contava com a sorte de um movimento bom, salvo todo o calor que sentia no interior do veículo, gostava do ofício. Nada poderia substituir o prazer do vento no rosto, poder tragar seu cigarro, e o fazia umas 30 vezes religiosamente. Sua cidade não possuía características de metrópole. Intensificava o movimento em dias úteis, seu ponto estratégico, próximo a rodoviária. De lá, aconchegado no seu banco com encosto típico de bolinhas de madeira, que certo "estudioso de ergonomia" lhe disse que faria bem à coluna. Não titubeou; adquiriu e ainda comentou que ficaria bem no carro, típico apetrecho de decoração, somado às fitas de santinho, inúmeros devotos de Nossa Senhora, presos ao espelho retrovisor. Não partia com o carro sem que se benzesse nelas, as fitas coloridas.Sentia-se protegido.Iniciou suas corridas, poderia enumerar alguns passageiros que lhe valessem a pena comentar. Alguns iam e vinham, sem contudo, que se notasse algo que lhe  chamasse a tenção. Naquele dia ensolarado, calor escaldante; Recebeu o último chamado da tarde, depois daquela corrida pretendia voltar pra casa, banhar-se e aproveitar o cair da noite, tomando "umazinha" - bem gelada na varanda da casa. O passageiro abriu a porta, usava chapéu, sentou-se , reparou o banco um pouco desalinhado - O carro não era novo - e ainda lhe faltavam algumas várias prestações no carnê para quitação. Pediu com voz baixa dirigir-se ao centro - tinha pressa no falar - Quase que balbuciando algumas palavras ininteligíveis. Mas o motorista não estava ali para questionar. Correu passar a marcha e tocou rápido rumo ao destino solicitado. De onde estava até o destino local, considerando o trânsito do horário; levaria uns 40 minutos.durante o trajeto sentiu a estranha sensação que o homem chorava, achou que estava enganado, o barulho persistiu, resolveu observar pelo espelho; não costumava fazer isso. Mas estava intrigado com a situação. Interagiu ao  perguntar se estava acontecendo alguma coisa. De antemão o homem disse, baixinho, que tudo estava bem e que ele estava um pouco resfriado, pediu para não se preocupar e continuar o trajeto. Cumprindo suas ordens continuou e observou, chegando ao local,  se tratar de uma casa de repouso. Nunca havia levado nenhum passageiro ali. E o fato de pegá-lo próximo à rodoviária o intrigou ainda mais. O que viria fazer numa casa assim - Quem estaria visitando.Parou, abriu a porta o moço desceu e apressadamente perguntou quanto teria ficado a corrida. Tão logo informado, o praça perguntou o horário para buscá-lo, e embora jovem o homem, disse-lhe ainda com voz baixa, não ser necessário. Ali estava sua morada e dali não sairia. O nobre motorista, assustado com a resposta recebeu a corrida e desejou-lhe boa sorte. Foi embora pensando como seria triste uma última corrida e o destino certo ser o derradeiro, sem volta. Acendeu um cigarro e acelerou mais ainda, quis a sensação de liberdade para afastar a ideia de clausura. Seguiu seu rumo. Amanhã teria outro dia para dar colorido à sua vida e não pensaria duas vezes para fazê-lo!

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